Cidacs Informa - Sífilis
Boletim mensal temático do Centro de Integração de Dados e Conhecimentos para Saúde (Cidacs/Fiocruz Bahia) - Edição de março de 2022 sobre Sífilis
O Cidacs Informa de março é dedicado ao Projeto Sífilis, que busca avaliar os determinantes sociais e o impacto direto e indireto de políticas de proteção social na Sífilis Gestacional e Congênita, no contexto brasileiro.
A sífilis atinge diversas pessoas ao redor do mundo e a consequência dessa infecção em mulheres pode ser a transmissão vertical da doença para o feto, que, além da prematuridade, pode causar aborto ou malformações congênitas e alterações físicas e neurológicas. Entretanto, apesar da urgência em abordar os diversos aspectos de sua transmissão e agravos, a sífilis é considerada uma doença negligenciada, por ainda atingir tantas pessoas, mesmo possuindo um tratamento de baixo custo. Além disso, o tema costuma receber pouca atenção tanto na priorização das políticas de saúde, como no desenvolvimento de estudos, conforme será mostrado nesta Newsletter.
Desde o início do projeto, a equipe de pesquisadores vem trabalhando para compreender o comportamento da sífilis, identificando os fatores que possam contribuir para o aumento no número de casos em todo o país. Assim, o grupo vem realizando análises da qualidade das informações relacionadas às notificações da doença, avaliando os determinantes sociais e o impacto do Programa Bolsa Família na Sífilis Gestacional e Congênita.
Espera-se que os resultados possam informar a tendência da ocorrência da doença, nas últimas décadas, e quais os principais determinantes para evolução na população geral, e em subgrupos populacionais específicos, como os indígenas e quilombolas.
Nesta edição do Cidacs Informa, você ficará por dentro dos principais produtos e atividades que vem sendo desenvolvidos neste projeto, realizado em parceria com o Ministério da Saúde, a Universidade Federal da Bahia (UFBA) e a Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP/Fiocruz). Além disso, você também poderá conferir algumas ações realizadas pelos pesquisadores na sessão de Momentos Marcantes e entender um pouco das estratégias de vinculação de dados.
Vem com a gente!
📊 O problema da subnotificação
A Sífilis é uma doença causada pela bactéria Treponema Pallidum que atinge milhões de pessoas no mundo, apesar de possuir fácil diagnóstico e cura por meio de um tratamento de baixo custo. No Brasil, a doença teve diminuição no início dos anos 2000, mas na última década vem aumentando sua incidência, tanto para a forma Congênita (SC), quando é transmitida durante a gestação, quanto para a Gestacional (SG), quando a gestante testa positivo para a sífilis.
Só é possível adotar ações para diminuir essas taxas, se antes entendermos a dimensão que a doença vem tomando na atualidade. A notificação da SG e SC possibilita identificar a magnitude da doença na população, a sua distribuição e tendência no território nacional. No entanto, a subnotificação dos casos pode ser um problema para as estimativas de ocorrência da sífilis.
Partindo deste princípio, os pesquisadores deste projeto buscaram analisar os problemas nos registros de casos em bases de dados nacionais do Sistema Informação de Agravos de Notificação (SINAN), a fim de demonstrar os seus efeitos na detecção e controle de sífilis e na tomada de decisão de políticas específicas.
O resultado pode ser encontrado no artigo "Accounting for under-registration in GS and CS cases in Brazil, SINAN 2007-2018", que analisa a subnotificação dos casos de SG e SC no Brasil e estima as incidências nas 557 microrregiões do país. Alguns resultados preliminares deste estudo indicam que, em média, mais da metade dos casos de SG e SC não foram notificados em todo o país, no período de 2007 a 2018.
🔢 E sobre a completude dos dados?
Uma outra parte deste projeto se dedica a estudar os problemas na qualidade dos dados registrados no Sistema Informação de Agravos de Notificação (SINAN). Entre diversos marcadores de qualidade da informação, este estudo explora a dimensão da completude, definida como o grau de preenchimento das variáveis contidas nos Sistemas de Informação em Saúde (SIS).
O problema da incompletude dos dados leva a impossibilidade de traçar um real perfil epidemiológico da sífilis no país, que além de reduzir a capacidade de planejar ações apropriadas de prevenção e controle, também afasta o país de atingir as metas da OMS de redução e erradicação da sífilis, em particular da congênita. Isso ocorre, pois a incompletude resulta em menor acurácia das informações sobre a doença, afetando a validade dos dados e o conhecimento do processo de saúde-doença.
A maioria das variáveis que foram selecionadas para análise apresentou grau de completude bom ou excelente para SG e SC. No entanto, aspectos como classificação clínica, escolaridade da gestante, tratamento do parceiro e raça/cor da criança foram classificados como ruins, ou muito ruins.
As variáveis foram classificadas em duas categorias: socioeconômicas e assistenciais, e a partir delas, foram estimados os escores gerais de completude. Os escores gerais e socioeconômicos de completude para SG e SC, respectivamente, foram classificados como regulares, enquanto o assistencial como bom. Diferenças nesses escores foram observadas entre as regiões, zonas de residências, e grupos étnico-raciais para as notificações de sífilis.
Os resultados preliminares desta pesquisa sugerem que apesar de terem ocorrido melhorias na completude nos dados das fichas de notificações de SG e SC nos últimos anos, ainda existem pontos que precisam de atenção. E sobre isso, você confere nos tópicos abaixo.
📈 Determinantes sociais da Sífilis
A sífilis é uma doença que acomete principalmente a parcela menos favorecida da sociedade, em que os fatores sociais são mais acentuados, estando associada à pobreza e suas condições de vulnerabilidade. Por isso, torna-se fundamental a investigação de seus determinantes sociais.
Os pesquisadores deste projeto estão realizando uma revisão de literatura científica sobre os determinantes sociodemográficos, econômicos, comportamentais, reprodutivos e de assistência à saúde, associados aos casos de Sífilis Gestacional e Congênita nos últimos anos, publicados no âmbito nacional e internacional, disponíveis na Biblioteca Virtual em Saúde (BVS) e nas bases United States National Library of Medicine (PubMed), Web of Science e Embase. Esta revisão sistemática subsidiará o estudo dos determinantes da sífilis, utilizando os dados da Coorte de 100 Milhões de Brasileiros, criada pelo Cidacs.
👥 Desigualdades étnico-raciais
Devido ao fato de algumas populações estarem em maior vulnerabilidade em relação a contrair a sífilis e a sofrer com seus agravos, torna-se necessário aprofundar as questões relacionadas ao impacto da sífilis na população negra e indígenas, bem como nas políticas de saúde que venham para diminuir essas disparidades étnico-raciais.
👉🏿 Sífilis em população negra
A revisão de literatura em curso, “Sífilis Gestacional e Congênita na população negra: uma revisão de escopo”, busca avaliar as desigualdades étnico-raciais focando nas mulheres negras, que vêm apresentando maior proporção nos índices de Sífilis Gestacional.
A partir daí, os pesquisadores do Cidacs decidiram mapear as publicações sobre Sífilis Gestacional e Congênita na população negra e foi observado a escassez de estudos relativos a temática.
Por isso, o projeto se dedica a esta investigação, visando contribuir para o debate social, sobre como o racismo impacta a população negra, identificando ações mais efetivas para o controle da sífilis nessas populações, a fim de contribuir para as políticas de equidade racial.
👉🏾 Sífilis em indígenas
Uma busca preliminar nas bases de dados bibliográficas não identificou nenhuma pesquisa cujo escopo da investigação fosse a Sífilis Gestacional ou Congênita em indígenas. A escassez de estudos sobre a temática continua sendo um obstáculo ao controle de seus agravos nessas populações, por isso, os pesquisadores desenvolvem um estudo para explorar a amplitude da literatura, mapear evidências atualizadas e identificar lacunas de conhecimento sobre a sífilis em Povos Indígenas, em todo o mundo.
A revisão de escopo em plataformas como PubMed, Web of Science, Embase e SciELO rendeu 24 estudos para análise. Os dados dos artigos foram coletados de 1989 a 2020 e concentraram-se na Oceania e nas Américas, sendo mais frequente na América do Sul, em particular no Brasil (50%). Os tópicos avaliados foram em ordem decrescente: Diagnóstico, oferta, acesso e utilização de serviços de saúde; Frequência de doenças e iniquidades em saúde; Qualidade dos dados relacionados a Sífilis Gestacional e Congênita; Determinantes de SG e SC; e Desfechos da SG e SC no bebê.
Embora as disparidades da sífilis entre populações indígenas e não indígenas sejam uma preocupação crescente de saúde pública, elas ainda são pouco documentadas. A literatura esparsa não é representativa da diversidade étnica e a doença, em suas formas Gestacional e Congênita, em povos indígenas, são agravos duplamente negligenciados. Dados confiáveis e a melhoria do acesso aos cuidados de saúde são necessários para reduzir a carga da sífilis e informar corretamente as políticas e a resposta dos serviços de saúde para mitigar as desigualdades étnico-raciais da doença.
💰🏥 Proteção social x Sífilis
Qual o efeito de programas de proteção social, em específico o Programa Bolsa Família (PBF), em desfechos relacionados à Sífilis Gestacional e Congênita?
Para responder a esta questão, em uma primeira etapa, os nossos pesquisadores têm desenvolvido uma revisão de literatura do tipo escopo, buscando em bases de dados nacionais e internacionais, estudos que avaliaram o efeito dos programas de proteção social em desfechos relacionados a sífilis. A literatura disponível aponta uma escassez de estudos sobre a temática, e até o momento não foi publicado nenhum estudo que avaliasse o impacto destes programas sociais na Sífilis Gestacional e Congênita. A maioria dos estudos triados até o momento são provenientes da China, sem registros de estudos no território nacional.
Em uma segunda etapa, os pesquisadores almejam avaliar o efeito do PBF na Sífilis Gestacional e Congênita, usando os dados da Coorte de 100 milhões de Brasileiros, do Cidacs.
👶🏻👶🏾 Mortalidade na Sífilis
A Sífilis Gestacional pode ocasionar diversos efeitos negativos nas crianças, entretanto, dados relativos a sobrevida de crianças com Sífilis Congênita ainda são limitados. Para preencher essa lacuna, os pesquisadores do projeto utilizarão uma coorte de base populacional de nascidos vivos, criada a partir da vinculação de dados coletados rotineiramente no Brasil, entre 2008 e 2018. O objetivo é estimar a mortalidade entre nascidos vivos com notificação de Sífilis Congênita em comparação com aqueles que não possuem a doença. Para isso, serão usadas as curvas de Kaplan-Meier e modelos de sobrevida.
#Eventos 💻
No ano passado, realizamos dois encontros, nos quais os pesquisadores debateram sobre os desafios de monitorar a sífilis no Brasil e sobre as suas desigualdades étnico-raciais.
Devido à pandemia de Covid-19, os encontros tiveram que acontecer remotamente e em ambos os eventos participaram importantes convidados especialistas, que apresentaram e debateram com o público e a comunidade científica sobre os temas.
Você pode conferir os eventos, na íntegra, clicando nos links abaixo:
Webinário: Sífilis no Brasil: Situação atual e desafios para o monitoramento
Webinário: Desigualdades étnico-raciais na sífilis gestacional e congênita no Brasil
#DestaquesDasMídias 🤳🏼
O projeto Sífilis também está presente no conteúdo das mídias sociais do Cidacs. Lá você não só fica por dentro das novidades deste projeto, mas também pode conferir as novidades e os achados sobre outras pesquisas.
Aqui você confere uma de nossas postagens sobre a incidência da doença e a influência dos programas de transferência de renda.
Se você ainda não nos segue, aproveita, pois estamos on!
#EntrevistaComPesquisador🎤📰
O grupo de pesquisadores do projeto Sífilis, do Cidacs/Fiocruz Bahia, se reúne semanalmente para discutir sobre as demandas e trabalhos. No entanto, alguns temas vêm ganhando destaque nas últimas reuniões e têm sido motivo de debates enriquecedores.
Abaixo você confere uma breve entrevistas sobre Estratégias de Linkage.
Convidada: Samila Oliveira
Samila é graduada em Estatística e Mestra em Matemática (com área de concentração em Estatística) pela UFBA. Possui experiência com Ensino Superior e análise de dados com foco na área de Saúde. Atualmente lidera o time de dados (Núcleo de Produção de Dados) do Cidacs/Fiocruz Bahia.
Victor Sales: Qual o principal desafio de trabalhar com dados administrativos?
Samila Oliveira: Sem sombra de dúvidas, o principal desafio ao se trabalhar com bases de dados administrativos é transformá-los em bases que sejam possíveis de serem usadas na pesquisa científica. Por isso, se faz necessário trabalhar com métodos e tecnologias que sejam capazes de contribuir para o tratamento das informações presentes nas bases.
Entre eles é possível destacar o pré-processamento, etapa na qual ocorre todo tratamento do dado para garantir sua consistência e assegurar sua qualidade para o Linkage. E o Linkage em si, que pode ser visto como enriquecimento dos dados, são processos essenciais para garantir a qualidade da informação e potencializar seu uso na pesquisa.
Victor Sales: Quais os principais objetivos dos Linkages neste projeto da Sífilis?
Samila Oliveira: O principal objetivo foi identificar se os indivíduos presentes nas bases de saúde também eram indivíduos presentes na nossa Coorte do Cidacs de 100 milhões de Brasileiros ou, no caso do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (SINASC), identificar também se a mãe de um nascido do SINASC se encontrava na nossa Coorte.
Repórter: Poderia sintetizar os Linkages realizados?
Pesquisadora: Nossas bases foram a Coorte de 100m de Brasileiros do Cidacs, Sistema de Informação Sobre Mortalidade (SIM), Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (SINASC) e Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN).
Os linkages entre a Coorte e as bases de saúde informadas, foi feito por meio do algoritmo de vinculação CIDACS-RL, considerando um conjunto de variáveis comuns presentes nas bases de dados, duas a duas: nome, nome da mãe, data de nascimento, sexo e município de residência. O Linkage padrão considera cinco variáveis, mas na falta de todas recorre-se ao Linkage com quatro ou três variáveis.
🔖 Momentos Marcantes
Quer saber mais? Clique neste link e confira os principais momentos marcantes para o Projeto Sífilis, como a apresentação do projeto para o Departamento de Doenças de Condições Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis (DCCI), do Ministério da Saúde, e algumas informações institucionais.
📰 Acontece no Cidacs
Uma nova colaboração do Cidacs, junto a pesquisadores da Oxford (Reino Unido) e Shaukat Khanum Memorial Cancer Hospital & Research Centre (Paquistão), utilizará dados não identificados de saúde de dois dos países mais afetados pela pandemia do mundo para aumentar a compreensão de pesquisas e acelerar o gerenciamento da doença. Esta nova empreitada, que possui financiamento da Fundação Bill & Melinda Gates, escolheu o Brasil, por ter sido o segundo país mais atingido pela pandemia, em 2020, e o Paquistão devido ao fato que a etnia do sul da Ásia está associada a um alto risco de infecção grave e mortalidade relacionada à doença. Leia a matéria completa aqui!
Você já marcou “ok” no checklist de eventos da Rede CoVida que estão acontecendo nas últimas semanas? Perdeu algum? Não tem problema, abaixo você encontra uma lista com todas as edições.
“Sobre a Pandemia de Covid19: Início do fim ou teremos recomeço?”
Como novas variantes do SARS-CoV-2 podem influenciar o curso e a superação da pandemia?
Como as vacinas anticovid funcionam e o que esperar do futuro?
Até a próxima!